No dia de ontem enviei à Srª Ministra da Justiça e aos grupos parlamentares a seguinte carta:
Reformar obrigará a encerrar?
Para que pagam os cidadãos impostos?
A índole governativa dos últimos tempos tem sido, sintomáticamente, fechar serviços públicos que outrora marcaram os valores civilizacionais de uma sociedade.
Na saúde, sob a justificação de que custa dinheiro, fecham-se centros de saúde ou valências desses mesmos centros de saúde,
Na educação, sob a justificação de que custa dinheiro, fecham-se escolas,
Na justiça, sob a justificação de que custa dinheiro, fecham-se tribunais,
A seguir, sob a mesma justificação, fechar-se-ão Conservatórias, Serviço de Finanças, Postos dos CTT, Serviços autarquicos, etc.
O local de destino destas medidas é normalmente o mesmo: O interior do país, já de si com grandes dificuldades de mobilidade de boa parte da população.
O fecho dos tribunais agora anunciado é mais uma dessas medidas sem qualquer justificação, quer financeira, quer organizacional, profundamente perturbadora da matriz cultural e civilizacional do país, fazendo-nos regredir aos tempos do antes do Estado Novo, aos tempos do Regedor e do Cabo de Ordens.
Contrariamente ao que a Srª Ministra anuncia como justificações genéricas para esta anunciada medida, os argumentos invocados não se verificam no terreno, demonstrando falta de trabalho de campo, de coerência e de uma estratégia para o sector da Justiça no país.
Na verdade, estes tribunais funcionam em edificios do Estado, sem encargos de rendas, contrariamente aos luxuosamente arrendados em Lisboa para o exercicio de tais funções, têm, em geral um Juiz e um Magistrado do Ministério Público e prestam um serviço de justiça com maior celeridade do que acontece nos grandes centros urbanos, transmitindo ainda à população local a convicção de que, se tiverem necessidade de recorrer aos tribunais terão, em conformidade com o sistema de mobilidade local, um tribunal na sede do concelho ao qual poderão recorrer.
Com a proposta da Srª Ministra, designadamente para Castro Daire, prevendo o fecho do tribunal local e orientando os serviços aí prestados para o tribunal de S. Pedro do Sul, está a Srª Ministra a mandar as pessoas de todo o concelho de Castro Daire, com algumas freguesias e localidades a mais de trinta quilómetros da sede do concelho para outro concelho igualmente a mais de trinta quilómetros de distância sem que exista qualquer rede de transportes ou carreiras públicas regulares entre as diveras freguesias de Castro Daire e S. Pedro do Sul.
No entanto, está Castro Daire situado entre Viseu e Lamego, servido pelo A 24, com diversos nós de ligação à dita autoestrada e servido de transportes de carreiras regulares que ainda fazem o percurso Régua -Viseu, facto esse que torna muito mais fácil os residentes de Castro Daire chegarem a Viseu ou a Lamego do que a S. Pedro do Sul.
Por isso, pergunta-se: Porque a terem de se deslocar para aceder a serviços de justiça, terão os residentes de Castro Daire de se deslocar a S. Pedro do Sul e não a Viseu ou a Lamego?
Ora, se nesta estratégia do Governo de fecho de tribunais para concentração de meios algum haveria que fechar (solução com a qual não concordo), deveria ser exactamente o de S. Pedro do Sul por ser aquela localidade que menos acessibilidades rápidas tem com a capital do Distrito e outras vias rápidas, devendo parte da sua população deslocar-se, então, ou a Castro Daire, ou a Vouzela, ou mesmo a Viseu.
Na verdade, se se pretende fazer alguma reestruturação de serviços é preciso que se adeque essa reestruturação à realidade e não tentar impor a realidade às mudanças pessoais (não reestruturação porque o previsto não merece essa qualificação) que a dado momento alguém, por qualquer motivo menos claro pretende impôr.
Mas, se em nome da poupança de recursos que se pretende impôr uma vez mais ao interior do país, alguma reforma ao nível da justiça é preciso fazer, essa reforma não passa pelo encerrar de tribunais, mas sim pelo agilizar das decisões processuais, permitindo o acesso rápido da população a esses serviços.
Efectivamente, levando em conta que neste momento os Srs Juizes muitas vezes já não residem nas comarcas onde trabalham e que a maior parte do processo está informatizada, o juiz para trabalhar não precisa de estar fisicamente num só gabinete nem num só tribunal, bem pode ter um local – tribunal de base – e a partir daí desenvolver o seu trabalho em vários tribunais de uma região, caso o Ministério, na sua avaliação, considere que o trabalho a desenvolver num tribunal é insuficiente para ocupar todo o tempo de um juiz.
Nestas circunstâncias, sem provocar uma acréscimo injustificado de despesas aos cidadãos, que já pagam impostos para terem este tipo de serviços públicos, o Ministério da Justiça reduzirá os custos financeiros desses serviços, podendo reorganizar esse trabalho como melhor entender, sem colocar em causa direitos fundamentais.
E, já agora, não se alegue que as viagens dos Srs Magistrados ficariam caras, porque é a Srª Ministra que afirma que as deslocações que propõe às populações não têm relevância. Ora, custará muito menos a deslocação de uma pessoa do que a deslocação de 10 ou 20, números estes facilmente alcancáveis em qualquer julgamento.
Assim, em verdade, sem imposições troikistas nem impulsos irreflectidos, pense-se o país, quer o seu litoral, quer o seu interior, não deixando nunca de cuidar da dignaidade com que todas as pessoas merecem ser tratadas.
O interior, além de pinheiros e mato, tem pessoas.
Anulem-se os arrendamento milionários feitos pelo governo para funcionamento de serviços da justiça, alterem-se as regras processuais, quer ao nível do processo civil quer ao nível do processo penal, mantendo garantias de defesa em ambos os casos mas permitindo a agilização das diligências e, a final, teremos reorganização e poupança, com prestação de serviços públicos dignos a toda a população.
O país agradece que a Srª Ministra e os demais membros do Governo reflictam nisso.
Aurélio Loureiro